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pacto federativo

Um dilema carimbado na formação do Direito contemporâneo.

A formulação teórica do Estado-juiz é uma baita estripulia jurídica! Gosto disso, admiro a capacidade inventiva desses artistas que teorizam o Direito! Mas é bem interessante constatar quanta insanidade existe na alma humana, ao conceber um órgão judiciário do Estado, que julga o Estado, defende o Estado, condena o Estado e ainda decide as questões internas do Estado!

Pois é assim que a função jurisdicional é exercida. Das pequenas células denominadas juízos, aos músculos e tecidos bem especializados cognominados de Tribunais Superiores, a mesma realidade se repete. De fato, ora em refrega em prol do impávido organismo estatal, ora como paladino do sofrido povo na base piramidal da estrutura social, ora em combate pela figura mitológica do pacto federativo, nossa Corte Máxima espancou o Protocolo ICMS 21 do Confaz, o Conselho Nacional de Política Fazendária.

A façanha frustrada buscava obrigar o recolhimento de parte do malsinado Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços – ICMS nas operações interestaduais por meios eletrônicos ou telemáticos, em favor dos estados onde se encontram consumidores finais dos produtos comprados. Com desenvoltura e por unanimidade, a Suprema Corte cumpriu sua missão, mostrando sua dupla face ― órgão do Estado contra os estados.

Estou a me transportar ao “Baile dos Tributos”, onde posso ouvir a voz da diva cancioneira popular, a maranhense Alcione, tangendo como lira suas poderosas cordas vocais, como se houvesse incorporado Têmis, a deusa da Justiça:

“Posso ser santa

Quando eu faço o pão

Pra sua comida

Com a mesma santidade

Eu te acerto a mão

Quando a gente briga

A natureza

Deu a luz ao escorpião

E ao profeta

A noite do ladrão

É a mesma noite do poeta”

(trecho da música “Duas Faces”)

Bastou a posologia certa de 155 artigos, 2 parágrafos, VII incisos e uma dose de alínea “b” do milagreiro remédio constitucional, para conter a insânia do Confaz e dos 20 estados signatários do Protocolo 21. As Ações Diretas de Inconstitucionalidade nº 4628 e 4713, relatadas pelo Ministro Luiz Fux, e a repercussão geral do Recurso Extraordinário nº 680089, sob a relatoria do Ministro Gilmar Mendes, questionavam a forma com que se pretendeu, supostamente, repartir a riqueza advinda do ICMS, cujas cifras bem recheadas crescem ainda mais quando se tem em mira o comércio eletrônico, que, somente em 2013, movimentou cerca de 28 bilhões de reais no Brasil.

Médicos e advogados combinam bastante quando a ideia é tornar complexo tudo o que é simples. Os primeiros se valem de um garrancho caprichado; os segundos se superam na criatividade vocabular. Para valorizar a decisão, a Suprema Corte considerou que havia uma inconstitucionalidade material porque o Protocolo não seria o meio adequado para uma “autotutela das receitas do imposto”. Em termos simplórios, a fixação das alíquotas interestaduais do ICMS é reservada a resolução do Senado Federal (art. 155, § 2º, IV). A retenção e recolhimento do ICMS em favor da unidade federada destinatária também instituiria “modalidade de substituição tributária para frente, o que somente poderia ser veiculada por lei em sentido formal, no caso, lei complementar” (art. 155, § 2º, XII, alínea “b”).

O Protocolo em questão ainda acarretaria bitributação e confisco. Ainda assim, o Ministro Gilmar Mendes, invadido do desejo de agradar o Estado “Maior”, a sociedade e os estados membros, destacou que “é preciso buscar alguma fórmula de partilha capaz de evitar a concentração de recursos nas unidades de origem, e assegurar forma de participação dos estados de destino, onde estão os consumidores”.

Resumindo: tem que ser bom para todos! Com bilhões de reais em jogo, todos poderiam se saciar. A cobiça, porém, parece ser o maior dentre os pecados que assolam os brasileiros!

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