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diferença

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Não equivale à liberdade religiosa, nem à livre expressão do pensamento. Não pertence ao campo da Moral; é matéria do Direito sim, senhor. Sua existência no mundo dos direitos desassossega a muitos, que ignoram sua existência ou sugerem que os institutos já criados lhe disciplinam o suficiente. Perdoem-me a insistência, mas sou apenas um jogador de basquete interessado em acertar o último arremesso, antes do tempo expirar.

Talvez seja ousado demais riscar poucas linhas teóricas em defesa do que é desprezado. Mas, ao longo de todo o jogo de 2014, nesta quadra do CawDiálogos, pude aprender um novo sentido de equipe, composta por aqueles que tem o mesmo ou diferente estilo de jogo, mas que, invariavelmente, querem ver a imaginação fluir para a rede da cesta balançar.

O intangível é o que há de mais simples, assustadoramente presente em nossas vidas, mediocremente notado em nossas existências. O pai do Pequeno Príncipe, Antoine de Saint-Exupéry, dizia:

“O essencial é invisível aos olhos. Só se vê bem com o coração.”

O que ninguém vê, toca, mede ou classifica, e exatamente por isso ninguém anseia; é o intangível. É o que é; é a essência. Quando está presente, é a importante companhia em que esbarramos para logo dispensar. Quando ausente, é a mera falta que não se sente. Ainda recorrerei a outra citação; uma parábola evangélica de conhecimento geral. Precisarei me alongar na transcrição, mas quem já a conhecer poderá pulá-la qual Saci Pererê:

“O Reino dos Céus é semelhante a um pai de família que saiu de madrugada, a fim de assalariar trabalhadores para a sua vinha. Tendo convencionado com os trabalhadores que pagaria um denário a cada um por dia, mandou-os para a vinha. Saiu de novo à terceira hora do dia e, vendo outros que se conservavam na praça sem fazer coisa alguma, disse-lhes: ‘Ide também vós outros para a minha vinha e vos pagarei o que for razoável.’ Eles foram. Saiu novamente à hora sexta e à hora nona do dia e fez o mesmo. Saindo mais uma vez à hora undécima, encontrou ainda outros que estavam desocupados, aos quais disse: ‘Por que permaneceis aí o dia inteiro sem trabalhar?’ — ‘É’, disseram eles, ‘que ninguém nos assalariou.’ — Ele então lhes disse: ‘Ide vós também para a minha vinha.’

Ao cair da tarde disse o dono da vinha àquele que cuidava dos seus negócios: ‘Chama os trabalhadores e paga-lhes, começando pelos últimos e indo até aos primeiros.’ — Aproximando-se então os que só à undécima hora haviam chegado, receberam um denário cada um. Vindo a seu turno os que tinham sido encontrados em primeiro lugar, julgaram que iam receber mais; porém, receberam apenas um denário cada um. Recebendo-o, queixaram-se ao pai de família, dizendo: ‘Estes últimos trabalharam apenas uma hora e lhes dás tanto quanto a nós que suportamos o peso do dia e do calor.’

Mas, respondendo, disse o dono da vinha a um deles: ‘Meu amigo, não te causo dano algum; não convencionaste comigo receber um denário pelo teu dia? Toma o que te pertence e vai-te; apraz-me a mim dar a este último tanto quanto a ti. Não me é então lícito fazer o que quero? Tens mau olho, porque sou bom?’

Assim, os últimos serão os primeiros e os primeiros serão os últimos, porque muitos são os chamados e poucos os escolhidos.”

(Mateus, 20: 1 a 16)

A íntegra da transcrição atende ao fato de haver o Mestre Nazareno traçado as linhas gerais mais evidentes para nos auxiliar a decifrar o icognoscível. Atento à ideia de que o intangível tem pé no essencial, o Majestoso Rabi falou em tempo, trabalho e salário, e rematou que quem tenha se apresentado à tarefa em horário posterior é digno da mesma remuneração. O direito surge na formulação: “os últimos serão os primeiros e os primeiros serão os últimos”.

Não importam os velhos padrões de definição do primeiro ou do último; impera a igualdade no direito ao intangível. Todos têm direito a ele, que representa o gozo, a fruição, o exercício do que se é. É o direito à autenticidade, à espontaneidade desembaraçada, à profunda transformação da vida para a vivência do ser intrínseco. O direito à realização da divina epopeia de descoberta e concretização da experiência mais fiel, a que chamamos “eu”.

Possa você iniciar essa trajetória transcendental no último dia da sua vida terrena ou no alvorecer da juventude; possa ter sido o criminoso mais cruel ou o vassalo mais servil; possa se reconhecer o mais preguiçoso vegetal ou o mais selvagem animal; todos, sem exceção, têm o mesmo direito ao intangível, à sinestesia do gosto, tato, olfato e visão musical das doces, macias e perfumadas belezas sonoras que assalaria os escavadores da própria alma. Eles leem seu passado e seu futuro na terra adamantina, que suja suas mãos de delicado brilho, e se deliciam com o presente celestial de se conhecerem melhor e viverem em permanente contato consigo mesmos, com sua essência.

Não me preocupo aqui com os direitos da personalidade; tampouco com o direito à liberdade, pluralidade ou diferença. Não se trata do direito à vida monástica ou religiosa. Válidos e valorosos, tais direitos compõem o cenário, coreografia, trilha sonora e interpretação no palco da vida. Não se dá o mesmo com o direito ao intangível. É visceral; diz respeito à vida em si, em seus bastidores, na direção, produção e conclusão do roteiro de quem somos e pretendemos ser.

Também não é o propalado direito à dignidade da pessoa humana, que entende por proteger as mínimas condições de vida e os muitos caminhos que todo homem e mulher pode escolher percorrer. Com o direito ao intangível não é bem assim. Esquivando-se ao rótulo de problematizante ou de complexamente indefinido, defende a ampla possibilidade de se conhecer a intrasensorialidade e a superação das trivialidades ilusórias pelo único percurso que cada homem e mulher há de encontrar.

Não é o direito de ir e vir, quando só uma direção a seguir. Mas, enfim, ainda teremos quem queira chamá-lo de direito à religiosidade, à espiritualidade ou à divindade humana. Seja o que for, haverá a intangível essência do direito que reserva aos que se apressam o final da fila e assegura nos playoffs quem deu valor ao que tem preço incalculável.

Feliz 2015!

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