Indenizações Jurismetrizadas — Parte II: Discurso Prático
Após massagear as ideias, retorno com os aparatos laboratoriais ou utensílios culinários, já anunciados.
Primeiramente, cortemos o termo: de um lado, “juris”; do outro, “metria” ou “métrica”. Muito bem! Neste momento, o “juris” é o que nos interessa. Basicamente, a reparação civil se apoia no axioma “a indenização mede-se pela extensão do dano”, transcrito do artigo 944, caput, do Código Civil. Acrescentemos, para cotejar e extrair a essência normativa do preparo, o que dispõe o artigo 152: “no apreciar a coação, ter-se-ão em conta o sexo, a idade, a condição, a saúde, o temperamento do paciente e todas as demais circunstâncias que possam influir na gravidade dela”.
Temos assim, de forma exemplificativa, os fatores decisivos para a segunda fase da receita. Até aqui, o meu amigo e minha amiga advogada já habituados à boa cozinha nada verão de diferente. Na fundamentação das sentenças sempre temos um ou outro sabor interferindo no paladar do arbitramento da indenização. Ora é uma senhora, ora um aposentado, ora o tempo de permanência da negativação, ora as tentativas frustradas de amigável solução… Os processos serão agrupados pela causa de pedir; se assemelharão pelos fundamentos de direito, para ser mais preciso (causa mediata). Somente os fatos, as circunstâncias relevantes para o deslinde do imbróglio (causa imediata) os desassemelhará.
O que propomos, e já adentramos na fase “métrica”, é a criação de uma simples fórmula, na qual os fatores de mais importância tenham uma arrumação de medida e peso. Passo a tomar mais um pedaço da sua atenção! Serei rápido!
Após a intensa atividade de garimpo dos estagiários que pingam seu dedicado suor no porcelanato dos Palácios da Justiça das diversas comarcas do Brasil, teremos, em hipótese, centenas de processos movidos em razão da interrupção do serviço de fornecimento de energia elétrica. O dano de quem tenha sido privado de energia, sem ter dado causa ao fato, é in re ipsa; decorre do próprio fato. All we know that!
Mas, sopesando punição e pedagogia, o juiz do nosso imaginário — atuando em raro Juizado Especial Cível sufocado de processos, mas presenteado pelo livre convencimento e prestigiado pela liberdade de avaliação das provas — tem a compreensão de que a indenização dependerá da observância do básico pressuposto fático da comprovação da quitação das faturas de consumo de energia elétrica, a depender de prova eminentemente documental. Presente esta condição, quantificará a indenização por danos morais tendo em conta os seguintes itens e escalas de valores:
Idade do Consumidor — peso 1 (escala 1: até 30 anos; escala 2: dos 31 aos 60 anos; escala 3: mais de 61 anos);
Horas sem serviço — peso 3 (escala 1: até 48 horas; escala 2: das 49 às 120 horas; escala 3: mais de 120 horas);
Contatos prévios para a solução da lide — peso 2 (escala 1: até 2 contatos telefônicos ou pessoais; escala 2: de 3 a 5 contatos telefônicos ou pessoais; escala 3: mais de 6 contatos telefônicos ou pessoais);
Prejuízos à saúde — peso 3 (escalas 1 a 3 de acordo com a livre apreciação das provas pelo juiz).
Distribuindo um peso maior e menor entre os fatores, e considerando como razoável para o “homem médio” a compensação dos danos imateriais em valor correspondente a um salário mínimo, que será atingido aplicando-se a escala 1 a todas as circunstâncias que não forem comprovadas ou, se alegadas, não tiverem impugnação específica na defesa (artigo 302, caput, do Código de Processo Civil), formularemos uma planilha, em versão bem simplória. O valor da indenização será extraído da operação aritmética que, associando a todos os fatores a escala 1, terá como resultado o valor de R$788,00 — o salário mínimo em vigência.
Por mais vergonhosa que seja a relação do advogado com os números, não alcançaremos outra equação, senão a seguinte:
Indenização por Dano Moral = 0, se ausente a comprovação da quitação das faturas de consumo;
Indenização por Dano Moral = Salário Mínimo (=788,00) x soma de (fatores x peso) ÷ soma dos pesos (= 9), se presente a comprovação da quitação das faturas de consumo.
Imaginemos, enfim, em amplo salão de audiência, a congregação de uma audiência conjunta relacionada a 50 processos, com autores, réus e respectivos patronos. É aberto o ato com a portentosa voz do juiz, emitida ao som de um microfone, propondo que as partes firmem acordos. A palavra é dada aos procuradores dos demandados, em menor número, que informam os processos em que podem ou pretendem conciliar. Os feitos solucionados por acordos são destacados e as atas para a formalização da transação são celeremente elaboradas pelo secretário do magistrado.
Encerradas as tentativas de conciliação, requisita-se aos doutos causídicos que apresentem suas peças de defesa e questiona-se, com esteio nos princípios da oralidade e informalidade, se há provas que enfrentem as alegações autorais. Pelas respostas apresentadas a cada caso, uma planilha previamente confeccionada pelo mesmo secretário, sob a supervisão do juiz, é complementada até que se tenha por finda a instrução. Enfim, é projetada em boa dimensão e em boa resolução, a combinação das provas constantes dos autos com os parâmetros de intensidade e grandeza dos fatos de maior relevo para o julgamento:
Cinquenta processos julgados em uma única audiência, com a duração de, no máximo, quarenta minutos. Adoro a jurismetria!
Contudo… Na pausa que antecede o ponto final deste escrito… Recordo que sempre fui tão obtuso com os algarismos… Deve haver algum equívoco muito sério em todo esse raciocínio… Não é possível que o Judiciário ainda não aplique uma lógica tão rasteira…
Vou massagear melhor as ideias! Se alguém puder me ajudar, desde já agradeço!